domingo, 26 de junho de 2016

Sobre ser de algum lugar..

Há muito tempo me considero cidadã do mundo, de todos os lugares que já viví levo um pouco e isso foi aos poucos construindo essa colcha de retalhos que me compõe.
No papel, tenho dupla cidadania, e portanto desfruto desse interessante privilegio de poder dizer que sou daqui ou que sou de lá. Privilegio que nada conforta na verdade, porque, podendo escolher, o questionamento dentro da gente é inevitável.
Tem muita coisa boa e ruim no Brasil.. reconheço e não sou dessas que endeusa o país depois que já não mora mais nele. No entanto, é engraçado perceber-me brasileira em pequenos gestos e manias,  e consequentemente reconhecer esses traços nos outros quando você está longe de casa. 


Explico. há alguns meses fui ao show do Yamandu Costa, aqui em Nova York, plateia lotada, ele entra, aplausos, e devagarzinho ele pega o violão, começa a tocar, de repente, totalmente inesperado, colocou uma perna sobre a outra, e as duas sobre a cadeira enquanto tocava, como se estivesse no sofá de casa (mas na verdade estava diante de umas mil pessoas, num teatro renomado da capital do mundo). A plateia reagiu com graça, àquela graça e despojamento do musico. Eu pensei.. que linda a brasilidade, é tão despojado e informal como quase todos nós somos, mesmo sem que percebamos.
A lógica é simples: o violão é o instrumento dele. ele toca por horas e horas todos os dias. Porque ele teria que ficar em freeze e todo certinho diante da plateia? Se estiver com vontade de colocar a perna na cadeira, ele vai colocar, ué! porque não? Porque somos assim.. somos informais, somos barulhentos, somos sensíveis, gostamos de pegar, encostar, pedir, amar, beijar, abraçar.
Porque não temos a rigidez de nos preocuparmos em manter uma barreira, nós nos espaçamos, nos espreguiçamos, com espaço, ou mesmo sem espaço. somos intensos e dramáticos.
Essa informalidade eh libertadora em muitos sentidos, permite que os movimentos sociais sigam se expressando, que o amor nasça de maneira inesperada num simples olhar, mas não podemos negar que gera também uns probleminhas ( não no caso do yamandu, mas num outro tipo de recorte social).

Esse jeito brasileiro dá espaço para uma gente genuinamente maravilhosa e sensível se destacar. Esses dias entrei no metro e ao ouvir algo que parecia uma bossa, fui logo procurar de onde vinha a musica. To esperando meu trem chegar, mas não me contive, e sem que percebesse eu tava timidamente dançando um pouquinho, obviamente o musico me reconheceu brasileira, assim como eu o reconheci brasileiro. Sorrimos, e o trem chegou. É simples assim, não precisa de muitas palavras. Num outro dia, to caminhando pelo bairro e vejo um grafiteiro na rua, pintando um muro enorme e todo colorido, olho de novo e a bandeirinha do Brasil bem embaixo da assinatura da obra.. sabia. Brasileiro! e assim um sem fim de exemplos..

Fui ao show do Caetano e Gil aqui em Nova York,  e a cada letra que cantavam me doía no peito , fosse de orgulho do meu pais, fosse por que aquelas musicas falavam de uma dor q só a gente sabe como é sentir.  Era fácil distinguir os brasileiros entre toda a plateia.. os Brasileiros cantavam junto, suspiravam, sofriam, choravam de emoção com cada musica, enquanto os outros todos apreciavam o show 'normalmente'. Uma amiga americana que estava comigo no show disse: nossa, como é intenso e caloroso, né? .... e eu respondi " é, é bem Brasileiro na verdade"

E é por sentir assim, tão a flor da pele, que "ate beijo de novela me faz chorar".. é por sentir assim tão a flor da pele, que a generosidade é parte, e o sorriso é solto.
Por essas e tantas outras coisas.. mesmo que eu tenha o privilegio da escolha, quando me perguntam de onde sou, eu não tenho nenhuma duvida ao dizer que sou Brasileira, sou latina, sou feminista, sou mulher, sou livre!  

Sorrimos com os olhos..e com todos esses sorrisos sigo meu caminho. 

Um comentário:

  1. Concordo com suas palavras. Mesmo com todos os problemas, qual país não os te tem, em maior ou menor grau? A brasilidade é acreditar, é amor. Pegamos, somos espaçosos sim, mas isso não nos faz menos humanos, apenas brasileiros.

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